Dossiê: Ensino de alemão e de línguas teuto-brasileiras no Brasil: decolonialidades em
curso
A resistência ao colonial é característica dos povos colonizados, visto que: “todo povo colonizado — isto é, todo povo no seio do qual nasceu um complexo de inferioridade devido ao sepultamento de sua originalidade cultural — toma posição diante da linguagem da nação civilizadora, isto é, da cultura metropolitana” (FANON, 2008, p. 34). Sendo assim, entre os últimos anos do século XIX e o período Pós-II Guerra, a resistência que acontecia na América-Latina, especificamente, apontava para o argumento que a modernidade, o avanço científico e o pensamento secular seriam fenômenos presentes em todas as culturas, e não somente naquelas que se impuseram e disseminaram a hegemonia cultural de determinadas partes do Norte Global.
Essa ótica possibilitou mais recentemente que o pensamento decolonial ganhasse destaque no Brasil. Entretanto, vale ressaltar que nossos precursores, como a população aborígene destes territórios e os escravizados, trazidos da África, em grande parte resistiram às barbáries linguístico-culturais impostas pelos ditos civilizados, resilientes, mas nunca passivos, como destaca Cusicanqui (2010) em “Oprimidos pero no vencidos”. Cientes desses fatos, nós pesquisadoras e pesquisadores contemporâneos dialogamos e comungamos com os ideais dos nossos antecessores e, ao mesmo tempo, reforçamos a luta, juntando nossas vozes às de Lélia Gonzalez, Paulo Freire, Ailton Krenak, Aníbal Quijano, Catherine Walsh, Ramón Grosfoguel, Walter Mignolo dentre muitas outras pessoas. E neste contexto específico, procuramos expressar as nossas preocupações na Linguística Aplicada que entende a língua como prática social, não dissociada da cultura, assumindo também o seu lugar transdisciplinar que marca sua autonomia e ligação com as demais áreas do conhecimento humano.
É a partir deste locus enunciativo de pesquisadoras(es) linguistas aplicadas(os), que fomentamos a problematização do ensino-aprendizagem de línguas a partir do plurilinguismo, posto que a situação geolinguística no Brasil e no mundo é multicultural e, por conseguinte, plurilíngue. Nesta perspectiva, nós na condição de professoras(es) da língua alemã nos juntamos às discussões proferidas por nossas e nossos colegas professoras(es) de outras línguas ensinadas e faladas no país, dialogando com estudos decoloniais, e propomos, este Dossiê temático que visa oferecer um espaço para a discussão dessa constelação linguística complexa.
Cabe destacar que a presença de variedades da língua alemã no território brasileiro está ligada ao início do projeto colonial em terras brasileiras, mas sofreu profundas mudanças na vitalidade, concepção e reconhecimento, provocadas pela colonialidade ao longo do tempo, mesmo se tratando de uma língua europeia de prestígio. Portanto, a história da língua alemã no Brasil e das línguas teuto-brasileiras envolve repressão, estigmatização e elitização, e sendo assim, como muitas outras, está interpelada pela a história da colonialidade e da resistência decolonial, o que indica que analisar a colonialidade linguística é mais complexo do que parece. E para que isso possa ser feito de maneira mais bem sucedida, o estabelecimento de parcerias se torna imprescindível, bem como a definição de locais de troca.
Assim, a fim de suscitar reflexões, provocações e propostas nesse sentido, relativos ao ensino de língua alemã em nosso país, convidamos estudiosas e estudiosos da área, desde o nível de graduação até os profissionais em serviço, a submeterem trabalhos para compor o dossiê intitulado “Ensino de alemão e de línguas teuto-brasileiras no Brasil: decolonialidades em curso”. A proposta é discutir perspectivas de reflexão e de ação política decolonial no ensino de alemão em nosso país, com o intuito de pensarmos novos paradigmas para educação linguística nessa língua, conforme as diversas realidades socioeconômicas e linguísticas que compõem a complexa paisagem linguística brasileira.
Se a língua não é uma entidade estática, atomizada e isolada, é o momento de repensarmos as acepções coloniais sobre como ensinar alemão para aprendizes em território brasileiro, contemplando assim as classes minorizadas. Se a língua é uma prática social, é hora de sulearmos a educação linguística em alemão no Brasil!
Palavras-chave: ensino de língua alemã, línguas teuto-brasileiras, educação linguística, interculturalidade, relações étnico-raciais, decolonialidade
Organização:
Prof. Dr. Milan Puh (USP)
Marina Grilli (USP)
Ivanete Sampaio (UFBA)
Data de envio: 31/01/2022
Possível prazo de publicação: Março/Abril de 2022
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